Dobras.
O Barroco se reinventa há centenas de anos em novos conceitos e interpretações, de acordo com diferentes contextos sociais e culturais, como redobras da matéria e dobras da alma segundo Gilles Deleuze.
No contemporâneo constitui-se por excessos, extravagâncias, e exposição do que antes era velado e cuidado. O corpo e a pele exposta, como commodities, perdem a potência plástica pelo excesso de repetição e reprodução.
Nos trabalhos Dobras, resgato e reexamino o encontro do Barroco com o contemporâneo, em releituras de trabalhos do escultor Barroco Bernini (1598-1680), que genialmente representou o contato entre peles, e tecidos em movimentos exacerbados em fluxo.
Retiro os personagens e refaço os planejamentos. O mármore com seu peso é substituído por material leve. São trabalhos feitos com pergaminho, em que subverto a relação do que recobre e do que é velado. A pele passa a ser a cobertura de um nada.
Mantenho os títulos das obras originais, e as roupas ou drapeados tem nomes próprios.
Retiro o observador da sua atitude passiva.
As esculturas chamam a atenção para uma ausência induzindo a questionamentos. Tornam-se potência a partir do estímulo da imaginação, tão escassa na contemporaneidade.
A curiosidade do espectador re-subjetiva o corpo, tornando sua fruição ativa.
Peles
Barrocos I, II e III.
O Barroco é definido pela dobra que vai ao infinito; o tecido, vestimenta que libera sua subordinação ao corpo. Dobras que já não se explicam pelo corpo e tem sua própria autonomia. Um drapeado sob forma de fluxo, uma potência, como alegoria que desvela um tempo indeterminado pela combinação do eterno e do instante.
Barrocos são trabalhos em que evidencio um corpo exposto, em que o que interessa não é a imagem/corpo, porque no contemporâneo ela está destituída de importância plástica, pelo excesso de reprodução e exposição. A pele e carne expostas, despojadas das suas vestes, despojadas da sua proteção perderam seu valor. O que interessa é o que devém destas imagens, do que dela se subtrai e acrescenta.
Estamos num momento de explosão de um barroco que mostra e re-mostra, aquilo que antes era velado e cuidado. É o barroco de uma falta de pudor pela dor do outro. É um Barroco às avessas. São as “dobras” levadas ao infinito pelas redes sociais, do sangue e da tragédia não mais encobertos.
O Barroco não se encontra mais nos drapeados que recobriam os corpos. O corpo está nu. A pele está exposta e dessacralizada.
É a dilaceração deste corpo que passa a ser de interesse; é o que dele se subtrai, o que dele se produz, o que dele é consequência e o que dele se transforma. Os horrores e o sofrimento não são mais encobertos, são midiatizados. Viram objetos de exposição, objetos para atrair a atenção. É a estética da mídia que viraliza e espetaculariza a dor.
Pela repetição até a náusea, tornamo-nos imunes à dor do outro, e vivemos uma perversidade implícita que nem mais percebemos. É o desdobramento desta dor, é o Barroco desta dor que eu quero mostrar.
O instante do movimento que outrora se buscava na escultura, a fluidez, o corpo belo, estético e harmonioso não interessam mais. O corpo está duro, a pele dura, a pele exposta, a pele crua; rígida.
O que entranha no nosso olhar a cada dia é o fluxo e o desdobramento da dor, do sangue, do horror. É isto que eu quero chamar a atenção e re-subjetivar.
Ao extruir o vermelho e expulsá-lo do corpo sob a forma de alegoria, de um Barroco, restituo a potência ao que hoje tornou-se vulgar.
Quando mostro meu trabalho, a 1ª pergunta que é feita é: Isto é sangue?
Foto-pinturas em alto relevo.
Diatropias.
Técnica mista - Impressão fotográfica em tecido, brim de algodão, manta acrílica, tinta acrílica, costurados em tela sobre chassi.